Percival Puggina como do DIABo gosta: “Aprecio o senso de humor daqueles que, em meio aos tapetes e estofados do poder, afirmam estarem as instituições funcionando normalmente.
Às vezes eu os imagino reclinados num triclinum (sofá romano), erguendo um cacho de uvas sobre a cabeça e trazendo-as à boca diretamente do cacho. Na verdade, uma sátira do que fazem com o Brasil.
As instituições funcionam como o diabo gosta. O diabo ama a corrupção, os corruptos estão por toda parte e o Supremo leva jeito para lidar com eles. O diabo acolhe no seu reino a bandidagem, cuida de sua formação, sopra-lhe nos ouvidos todas as tentações. E o Congresso, caiam-lhe em cima os xingamentos e os e-mails, chorem viúvas e órfãos, não vota a prisão após condenação em segunda instância. O diabo odeia a polícia, o promotor, o juiz. E as instituições fazem tudo para neutralizar seus trabalhos. O diabo foge da cruz e as instituições riem de quem a menciona. O diabo cultiva a preguiça e as instituições fogem do trabalho adicional. O diabo e as instituições confiam com fé cega nas urnas eletrônicas que, de modo prudente e zeloso, desmaterializam nossos votos.
Nas condenações de Lula, o povo viu as provas, tanto quanto vovô viu a uva, mas o STF deu Mandrake nelas e as anulou, todas, de uma vez só. Agora, para crime velho, só vale prova novíssima. O povo quer que o governo cumpra seu programa e disponha de mais recursos para o atendimento da sociedade, mas as instituições cuidam de si mesmas, dos partidos, de seu custeio e de suas campanhas eleitorais. O diabo, claro, ri à toa.
Sinceramente, eu podia passar a noite alinhando nossas contrariedades ante o mau funcionamento das instituições que nada ou quase nada fazem daquilo que a maioria da população quer, e em favor do quê se manifestou nas urnas e nas ruas. Retoma-se no Brasil a temporada de crises, encrencas e injusta repartição dos prejuízos gerais. Pergunto, nossas crises são causadas: pelos agentes econômicos? / pelo povo trabalhador? / por alguma potência estrangeira? / por fenômenos naturais? / por fenômenos sobrenaturais? / por falta de sorte, ou por acaso? Ou são ocasionadas pela política segundo nos foi imposta por uma Constituição cujo caráter democrático se resume em conferir ao povo o direito de votar e se resignar por quatro anos?
Expressar indignação? Bem, posso entender errado o que ando lendo e vendo, mas parece que a crítica a políticos, em especial ao presidente, está liberada. Já o STF só aceita a crítica reverente, com data vênia e de acordo com a verdade segundo a veem seus ministros. Quem chegou ao poder sem voto se vê como a cereja da torta da democracia. “Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor).”
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